Charles Morris, no livro Fundamentos da Teoria dos Signos, de 1938, dá uma das certidões de nascimento da Semiótica; ela seria um passo importante para um programa de unificação da ciência. Foi a partir dos escritos de Morris que se fixou o vocabulário que designa os principais ramos da semiótica, a sintática, a semântica e a pragmática. A contribuição de Morris, no entanto, logo foi eclipsada pelos estudos de Carnap, que prometiam levar adiante o sonho de unificação da ciência que ambos partilhavam. São de autoria de Carnap as primeiras definições e as investigações mais detalhadas desses ramos da semiótica.
Carnap assim as apresenta: “Se em uma investigação é feita referência explícita ao locutor, ou, em termos mais gerais, aos utilizadores da língua, então tal investigação pertence ao campo da pragmática (se neste caso é feita referência também aos significados ou não, não faz nenhuma diferença para esta classificação). Se fazemos abstração do utilizador da língua e analisamos somente as expressões e seus significados, estamos no campo da semântica. E se, finalmente, fazemos abstração também dos significados e analisamos apenas as relações entre as expressões, estamos no campo da sintaxe (lógica).”
A pragmática, segundo Carnap, consiste no estudo das expressões lingüísticas em relação às intenções do falante, na habilidade lingüística, crenças, audiência e contextos de uso.
Se o falante e o ouvinte são eliminados da cena lingüística, o que permanece é a linguagem e a relação de suas partes à objetos, eventos, aos designata. Esse é o campo da semântica.
No passo abstrativo seguinte removemos os designata e o que nos resta então são as expressões lingüísticas e as relações internas entre elas. Esse é o campo da sintaxe, que pode incluir a gramática das linguas naturais. Com a exclusão da gramática temos a sintaxe lógica.
Cada uma das dimensões pode ser subdividida em ‘pura’ (ou ‘formal’), ‘empírica’ (ou descritiva). Carnap apresenta em primeiro lugar a pragmática e então diz: vamos abstrair o usuário e nos concentrar apenas nas expressões e seus significados; teremos assim o campo da semântica. Se fazemos abstração dos significados, teremos a sintaxe, como estudo das relações entre as expressões. Assim a sintaxe deve ser autônoma em relação às outras duas disciplinas; a semântica deve ser autônoma em relação à pragmática. E a pragmática, por sua vez ? Como diz Carnap, não faz diferença alguma a inclusão ou exclusão do significado das expressões no caso da pragmática.
O que isso quer dizer ? No entender de Marcelo Dascal, “esta assimetria da posição da pragmática, se comparada a da semântica e a da sintaxe, tem conseqüências decisivas para o desenvolvimento do debate em torno da necessidade de se incluir um componente pragmático na teoria da linguagem. A consequência mais importante é que muitos defensores da pragmática, que implícita ou explicitamente se colocam dentro do quadro carnapiano, conceberão a sua defesa como sendo essencialmente um ataque à semântica. Sua estratégia consistirá em demonstrar a necessidade da pragmática através da demonstração da não autonomia da semântica em relação à ela.”
Essa observação de Marcelo Dascal está endereçada aos estudos da lingüística mas pode ser ampliada para a filosofia da linguagem. Basta lembrar que ao apresentar essa divisão da semiótica Carnap esclarece que a pragmática será sempre uma investigação empírica, pois diz respeito ao que acontece com os falantes de uma dada língua. É sobre esta situação inicial da pragmática que se pratica a abstração que possibilitará a elaboração de uma semântica e de uma sintaxe, tanto empírica (no caso do estudo de uma língua ordinária) quanto pura ( no sentido lógico, de linguagens simbólicas artificiais, formais). Carnap não contempla a possibilidade de uma pragmática pura ou lógica pois isso lhe parece um contra-senso.
O livro Fundamentos da Teoria dos Signos foi publicado em 1938, como segundo número do volume 1 da International Enclyclopedia of Unified Science, pela University of Chicago Press. Diz Morris na introdução: “O significado da semiótica como uma ciência reside no fato que ela é um passo na unificação da ciência, já que ela provê as fundações para qualquer ciência especial dos signos, tais como a lingüística, lógica, matemática, retórica e (em alguma medida ao menos) estética.” (Writings, p. 17)